terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

PESQUISA ABRE CAMINHO PARA TRATAMENTO DA MIOCARDITE CHAGÁSICA.

  Uma das sequelas mais graves da doença de Chagas é a cardiopatia decorrente de uma inflamação crônica no músculo do coração – a miocardite –, que destrói o órgão lentamente. Pesquisa recém-concluída na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), ajudou a compreender melhor a participação do sistema imunológico nesse processo, abrindo caminho para novos tratamentos.
  Segundo os resultados divulgados em dezembro na revista PLoS Neglected Tropical Diseases, dois tipos de linfócitos – as células T reguladoras (Treg) e as células T auxiliares ou “helpers” 17 (Th17) – são os principais responsáveis por modular a intensidade do ataque ao parasita causador da doença: o Trypanosoma cruzi. Quando esses linfócitos estão diminuídos no organismo do hospedeiro, o ataque ao T. cruzi é mais intenso e, consequentemente, a agressão do próprio sistema imunológico ao coração também é maior. Já os portadores de doença de Chagas com maiores quantidades de Treg e de Th17 circulantes apresentam melhor prognóstico e um quadro assintomático na fase crônica da doença.
  Posteriormente, com base na análise de amostras de sangue de pacientes com doença de Chagas, os cientistas viram que também em humanos há uma relação clara entre a quantidade de Treg e de Th17 circulante e a gravidade da miocardite. “Com base nesse conhecimento, é possível predizer quais pacientes assintomáticos são mais suscetíveis a desenvolver cardiopatia. A descoberta também abre caminho para o desenvolvimento de medicamentos capazes de aumentar a produção de Treg e Th17 e modular a resposta imunológica”, disse.
  A doença de Chagas é a principal causa de miocardite. Segundo dados da Fiocruz, estima-se que haja aproximadamente 20 milhões de pacientes infectados na América Latina. Entre 25% e 35% devem desenvolver alterações cardiovasculares.
  De acordo com Silva, acreditava-se no passado que não havia necessidade de tratar chagásicos assintomáticos, pois a principal droga usada contra o parasita – o benzonidazol – causa fortes efeitos colaterais e é contraindicada em muitos casos. Além disso, os benefícios do tratamento não estavam bem definidos.
  Estudos recentes, no entanto, mostram que todos os portadores de Chagas evoluem, mesmo quemuito lentamente, para a cardiopatia. “A velocidade do processo degenerativo vai depender da produção de células Treg e Th17”, explicou Silva. “As células Th17 estão envolvidas em doenças autoimunes, como artrite e diabetes. Por isso, acreditava-se que a presença delas no organismo estava relacionada com um mau prognóstico. Em nossa pesquisa, porém, vimos que, na infecção por T. cruzi e na leishmaniose, ela é benigna. Atua em parceria com a Treg para frear a resposta imunológica prejudicial”, afirmou Silva.
  A produção de Treg e de Th17 pode ser influenciada por fatores genéticos, doenças prévias, alimentação e pela microbiota intestinal, explicou Silva. No caso da doença de Chagas, a interação com o parasita também é fator determinante. “Em camundongos vimos que algumas linhagens do parasita estimulam mais a produção dessas células. Isso é determinado logo no início da infecção”, disse.
  Enquanto a busca por uma droga capaz de modular a produção de Treg e de Th17 não começa, os pesquisadores da FMRP, em parceria com o Instituto de Química de São Carlos, também da USP, trabalham no desenvolvimento de novos medicamentos capazes de matar o T. cruzi de forma mais eficiente e com menos efeitos colaterais do que o benzonidazol. “Um dos fármacos em teste tem uma molécula de rutênio que libera óxido nítrico – a mesma substância produzida pelas células para matar o parasita –, além de benzonidazol acoplado. Testes feitos em camundongos mostraram que ele foi capaz de matar o T. cruzi com uma dose mil vezes menor que a do benzonidazol isolado”, contou Silva. Segundo o pesquisador, a grande vantagem do candidato a fármaco é a liberação lenta e direcionada dos compostos ativos, diminuindo assim seus efeitos colaterais.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

ANTI-INFLAMATÓRIOS E RISCOS DE EVENTOS CARDIOVASCULARES

   O anti-inflamatório não esteróide (AINE), diclofenaco, um fármaco frequentemente utilizado para o tratamento da dor e inflamação causada pela artrite, está associado a um aumento significativo do risco de complicações cardiovasculares. Ele aumentou o risco de eventos cardiovasculares entre 38% e 63% em diferentes estudos. O risco aumentado de diclofenaco foi semelhante ao do inibidor de COX-2, rofecoxib (Vioxx, Merck), uma droga retirada mercados em todo o mundo por causa da toxicidade cardiovascular.
   Numa meta-análise publicada on-line 12 de fevereiro de 2013 na revista PLoS Medicine, Henry e McGettigan revisaram os riscos relativos cardiovasculares dos AINEs, em estudos observacionais e randomizados. O Rofecoxib, etoricoxib e diclofenaco foram os três agentes mais consistentemente associados com o risco significativamente maior quando comparado o uso com o não uso. Rofecoxib aumentou o risco de eventos cardiovasculares graves entre 27% e 45%, e etoricoxib aumentou o risco em mais de duas vezes em comparação com o não uso. Em dois estudos observacionais, o diclofenaco aumento do risco de infarto agudo do miocárdio (IM) de aproximadamente 38% e 39%,  e o risco de eventos cardiovasculares de um modo geral de 40%. Em um ensaio randomizado, o diclofenaco foi associado com um risco 63% maior de eventos cardiovasculares em comparação com o não uso.
   Para o diclofenaco, a dose prescrita varia de 100 a 150 mg por dia, e esta dose é suficientemente elevado para causar eventos cardiovasculares.  Este risco não foi encontrado com outras drogas, como ibuprofeno, naproxeno e celecoxib, em doses baixas. Portanto elas devem ser prescritas em doses baixas para não aumentarem o risco de ataques cardíacos. O problema com o diclofenaco é que, mesmo em pequenas doses, ele aumenta o risco de eventos cardiovasculares.
   A Indometacina e o meloxicam tiveram um risco de eventos cardiovasculares moderadamente aumentado, ligeiramente maiores do que o naproxeno, o ibuprofeno e celecoxib,  quando utilizado em doses elevadas, em ensaios clínicos, mas não em doses mais baixas.
    Os riscos cardiovasculares associados com os AINEs são subvalorizados. A maioria dos AINEs, com a possível exceção do naproxeno, têm algum grau de risco cardiovascular associado. Várias fontes indicam que, particularmente os pacientes que são portadores de doença cardíaca, devem abster-se de o uso crônico de AINEs, se possível. É concebível que o diclofenaco tenha um risco maior do que os outros, mas na verdade o problema é da classe inteira.
   Em publicação do ano passado, a revista Circulation, mostrou que o uso de AINEs, foi associado com um risco aumentado de eventos coronários persistentemente em pacientes que já tiveram IM. Em mais de 43 000 doentes com IM que usavam AINEs, o seu uso esteve associado com um risco aumentado de 59% de mortalidade após um ano de uso, e de 63% depois de cinco anos de uso. Além disso, a utilização dos AINEs foi associado com um aumento do risco de morte coronária e IM recorrente.