quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

DADOS AMERICANOS SOBRE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CHAGÁSICA REVELAM UMA PERSPECTIVA SOMBRIA

   Novos dados sobre a insuficiência cardíaca causada pela doença de Chagas trazem uma perspectiva sombria e os médicos do único centro norte-americano de excelência nessa patologia mostraram que os portadores possuem uma mortalidade quatro vezes maior que aqueles com insuficiência cardíaca (IC) de outras causas. Os pacientes com miocardiopatia chagásica também são mais graves, com uma taxa de hospitalização duas vezes maiores do que os de outras etiologias.
   Dra. Sheba Meymandi (Olive View/University of California, Los Angeles Medical Center, Sylmar) e seus colegas apresentaram seus achados atuais quanto a prevalência, morbidade e mortalidade da doença de Chagas na população norte-americana nas Sessões Científicas de 2012 da American Heart Association. "A maioria de nossos pacientes, quando diagnosticados, têm apresentado Chagas há décadas; eles usualmente a adquirem na América do Sul ou Central", explicou. "Esses pacientes frequentemente têm mais arritmias ventriculares que os colocam em risco para morte súbita. Muitos de nossos pacientes utilizam amiodarona e possuem um cardiodesfibrilador implantado, mas eles apenas recebem choque após choque, então frequentemente precisamos colocá-los em terapia antiarrítmica dupla com amiodarona e mexiletina." E em casos graves, a única opção para os pacientes é o transplante cardíaco. "Existe um aumento importante na morbidade e mortalidade para os pacientes com insuficiência cardíaca chagásica, e isso ocorre a despeito de um tratamento muito agressivo".
   Um em cada cinco pacientes com IC na região de Los Angeles possui doença de Chagas. Pesquisas prévias conduzidas na América Latina mostraram que a miocardiopatia chagásica traz um pior prognóstico comparado com a IC isquêmica e não-isquêmica. Mas não existem dados recentes sobre essa doença em uma população habitante dos EUA.
   Ela e seus colegas estudaram prospectivamente 135 pacientes de seu hospital regional, que foram diagnosticados com miocardiopatia não isquêmica (fração de ejeção <40%). Todos os pacientes haviam residido previamente na América Latina por pelo menos 12 meses. Os testes sorológicos para doença de Chagas foram realizados no momento da inscrição pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC).
   O desfecho primário foi a mortalidade por todas as causas ou o transplante cardíaco, confirmados pela revisão de registros médicos, contato com familiares do paciente, e avaliação de bases de dados do Seguro Social. O desfecho secundário foi a hospitalização relacionada a IC. Os participantes foram acompanhados por uma mediana de 3,6 anos.
  Os pesquisadores descobriram que a miocardiopatia chagásica era uma causa comum de IC em sua população de pacientes, com uma incidência que se aproximou de um em cinco (19%). As taxas de mortalidade foram mais de quatro vezes maiores para aqueles com doença de Chagas, e a morbidade foi o dobro, comparado com pacientes com IC de outras etiologias
               Resumo dos desfechos: Taxas de sobrevida não ajustada e de hospitalização
Desfecho Chagas (n=25) Sem Chagas (n=110)       p
Taxas de sobrevida (%) <0,0001
2 anos      84     92
4 anos      54     88
Tempo de sobrevida médio, meses      42     54
Mortalidade bruta/ano (%)      13       3 <0,05
Ausência de hospitalização (%)*     0,01
2 anos      66     79
4 anos      35     63
Tempo médio sem hospitalização, meses      33     44
Hospitalização bruta/ano (%)      51     24 <0,05
                   *Tempo até primeira hospitalização ou último seguimento, o que ocorrer primeiro
   A pesquisadora disse que o tratamento da cardiopatia por Chagas com medicação antiparasitária antes do desenvolvimento de IC terminal pode reduzir ou prevenir sua progressão. Os pacientes também fazeram usos de antiarrítmicos e outras medicações para IC conforme necessário. "Todos os nossos pacientes recebem amiodarona, não apenas porque ajuda a controlar as arritmias - mesmo se ele não apresentavam arritmias nós tratamos com amiodarona, porque diminui a carga parasitária", disse Meymandi. A seguir ocorre a adição da mexiletina e outras medicações para IC, e geralmente um desfibrilador, disse ela. A ablação epicárdica pode também ser útil, por fim, muitas pessoas acabam na lista para transplante cardíaco.
   A doença de Chagas, nomeada depois que o médico brasileiro Dr. Carlos Chagas a descreveu pela primeira vez em 1909, existe apenas no hemisfério ocidental. Ela resulta de uma infecção pelo Trypanosoma cruzi, um protozoário parasita transmitido pelo inseto barbeiro, ou Triatomíneo, que possui o hábito de picar as pessoas adormecidas com a face descoberta. Existem cerca de 15 espécies de Triatomíneo que podem transmitir o T. cruzi, que geralmente se dissemina pelas fezes do inseto para o sangue quando a pessoa coça a pele no local da picada, ou através da contaminação de alimentos. Também pode ser transmitido pela transfusão de sangue, embora atualmente muitos países realizem triagem para o T. cruzi, incluindo os EUA. 
   A doença de Chagas ocorre do sul da Argentina até o México e mesmo no sul dos EUA, embora o alto padrão de vida torne os casos extremamente raros. As pessoas mais pobres estão em risco muito maior de infecção, pois o barbeiro vive nas paredes de cabanas, muito comuns nas áreas mais pobres da América do Sul e Central. Devido a grande reserva de T. cruzi, o parasita não pode ser erradicado, e o controle de vetores é o método mais eficiente de prevenção da doença de Chagas.
   De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 10 milhões de pessoas estão atualmente infectadas em todo o mundo e 25 milhões estão em risco; 10.000 pessoas morreram por doença de Chagas em 2008. A doença possui três estágios: uma fase aguda, com uma doença febril com duração de 30 a 60 dias, durante a qual os parasitas podem ser facilmente detectados no organismo. Se a infecção não é tratada, segue-se uma fase subclínica indeterminada, que pode durar até 10 ou 15 anos - a maioria dos indivíduos permanecerá assintomática por décadas, mas a cada ano cerca de 3% vão desenvolver lesões cardíacas ou gastrointestinais.
   A miocardiopatia crônica é a manifestação mais grave da doença de Chagas, e essa é a principal causa de miocardite infecciosa, eventualmente afetando de 20% a 30% daqueles com doença na fase crônica.
  Os únicos medicamentos disponíveis para o tratamento da doença, os derivados triazólicos nifurtimox e benzonidazol, não são aprovados pelo FDA e não estão disponíveis para prescrição nos EUA. O tratamento envolve tanto o uso do nifurtimox por três meses, que é utilizado três vezes ao dia, ou um curso de dois meses de benzonidazol duas vezes ao dia. Ambos os medicamentos são quase 100% efetivos em curar a doença se iniciados precocemente após a infecção, no contexto de fase aguda. No entanto, a eficácia de ambos diminui com o tempo de infecção.
   A ressonância magnética "é realmente importante nessa população de pacientes", observou, "porque mostra as cicatrizes, que não podem ser observadas no ecocardiograma. A função do ventrículo esquerdo dos portadores de Chagas pode ser normal, mas eles poderão ter diversas cicatrizes. Então nós os encaminharemos para um estudo eletrofisiológicos". Outras apresentações ecocardiográficas clássicas do Chagas incluem anormalidades segmentares do movimento das paredes e aneurismas apicais.
Referência: The Heart.org

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